terça-feira, 7 de junho de 2016

HÁ JACU NO PAU


Anos 70 Bahia – Episódio 13

O Bloco Jacu concentrava e saía na esquina do Hotel da Bahia, no Campo Grande. O carro abre-alas na frente, com a divina Valéria em estado de glória, ao lado do artista plástico Luís Jasmin. Todo mundo de cabeça feita, encharcado de cerveja até os pés. A alegria era muita e o cheiro de lança-perfume flutuava no ar. A onda azul tomava conta da avenida e a pororoca seguia levando a multidão, cantando em coro “Tomara que esse ano lhe encontre de novo/no meio da rua/no meio do povo/mortalha encharcada de cerveja até o pé/e a boca lambuzada de acarajé...” O Jacu não tinha cordas e, logo, aquela onda azul se misturava com a multidão e ficava tudo colorido. Todo mundo podia chegar, era o bloco mais democrático do planeta carnaval. “Venha do norte/meu irmão venha do sul/mas venha morrer de alegria/no seu bloco do Jacu."

WALTINHO QUEIROZ – O Carnaval da Bahia nos anos 70, o carnaval-participação, atraía jovens do mundo inteiro e o Jacu era um dos atores principais dessa polarização, bloco líder da utopia, desfilando celebridades como Fafá de Belém, Pelé, Clara Nunes, Gessy Gesse e outras tantas. Ao lado disso, a minha mãe [Luz da Serra, artista plástica e figura lendária na sociedade baiana] puxava a burguesia, o que fazia do Jacu um paradoxo ambulante, que era o todo misturado e isso é carnaval. (...) O Jaguar, do Pasquim, me disse que a Banda de Ipanema sabia da existência do Jacu e que nós éramos coirmãos. A coirmã do Rio tinha um lado cultural bem forte, tanto que manteve viva uma tradição que o Jacu personificava aqui na Bahia – a postura do bloco de metais, do bloco de sopro – e fez uma ponte tão grande que, agora, o carnaval espontâneo de rua no Rio está voltando com intensidade, com esse tipo de formação, que defendi na Bahia em contraponto ao mundo eletrônico. (Depoimento no livro "Minha vida com o poeta", de Gessy Gesse, pg. 227).


Fernando Noy – Abração, Waltinho, na memória da tua admirável mãe Luz da Serra Queiroz. Wally Salomão sempre brincava, rindo, da coincidência poética e também encarnada do seu nome, luz volátil, de cima, inesquecível!!!

JOVIANO PINHEIRO DE MOURA NETO – Já que a Valéria me estimula, vou recordar um pouco mais do Jacu. Foi como "um rio que passou em minha vida". Ainda te vejo hoje, despetalando-se em plumas azul turquesa e distribuindo paz, amor e felicidade, em tom debochado, muito próprio dela mesma, provocando suspiros e tantos ais da moçada. Para você entender o Jacu, tem que perceber que ele foi um bloco diferente desde sua criação. Irreverente, mas não irreversível: desde muito antes de toda esta corrida ecológica, já reverenciávamos aquela ave que habita as nossas matas. Contestando preconceitos sociais de então, caracterizava-se em suas faixas o direito à liberdade de expressão. Isto com todo o "chumbo" daqueles anos. No início, a “cacofatice” das palavras feriu seriamente a sociedade tradicional baiana e não conseguimos ir muito longe. Foram todos presos pela Civil. Sentenciados pelo delegado a ficarmos presos até o final do carnaval, fomos inocentados graças ao recurso jurídico de um dos nossos amigos, advogado, que no momento me falha a memória e que eu me desculpo por isto. Como, naquela época, já vivíamos sob a influência francesa do "é proibido proibir", o Jacu retorna novamente à avenida com um contingente bem maior que da primeira vez. Daí por diante o bloco ganha vulto e chega a milhares de participantes. Saindo sempre do Campo Grande, ou melhor, do tradicional Hotel da Bahia ao cair da tarde, o bloco iniciava o voo rasante no sábado de carnaval pela Avenida Sete. Lá ia o Jacu, irrompendo como uma pororoca pela avenida, aguardado pelas meninas ávidas de amor que suspiravam e iam ao seu encontro incorporando e completando em conteúdo a filosofia do bloco. Seguíamos como peregrinos andantes, cambaleando mas firmes, ao rufar dos tambores e do sopro dos metais, entoando aquele enredo que fazia a sua história. Emocionante e muito lindo! Mulheres, lindas, maravilhosas, turistas de todos os cantos do mundo encontraram no Jacu aquele abraço sincero, entre beijos de cervejas e acarajés. O Jacu era o povo nas ruas sem distinção de sexo, cor ou crença. "Le ce fair moi" de sua própria ordem, nunca aceitou o isolamento do cordão e dos populares. Todos tinham direito a acessar o “broco”, desde que trouxessem do fundo do coração amor, paz e alegria!!! (Em sua homenagem, Valéria!).

PITUCHA GOLDENSTEIN – Joviano Pinheiro de Moura Neto, dois de meus irmãos fundaram o bloco, no princípio minha tia fazia as mortalhas e minha mãe a feijoada, foi meu tio o delegado que soltou os meninos. Na época eu era muito pequena, mas, com o passar dos anos aproveitei demais essa mara que não volta mais. Um grande abraço.

PAULO ROBERTO FERREIRA – O Jacu foi a nossa obra-prima, mais prapular!

SÉRGIO SIQUEIRA – No primeiro ano que o Jacu saiu, ainda com poucos integrantes, todos foram presos ao passarem na frente da Secretaria de Segurança Pública com a faixa: “Há jacu no pau”.

MARIA PRADO DE OLIVEIRA – "Tomara que este ano eu te encontre de novo..."

SÉRGIO SIQUEIRA – No meio da praça / no meio do povo / mortalhas encharcadas de cerveja até o pé / e a boca lambuzada de acarajé.

MARIA PRADO DE OLIVEIRA – O bloco do povo da Bahia com carinho, que nunca teve corda, é livre como um passarinho...

CRISTINA SÁ – Era bacana, porém machista, só os homens participavam...

Geraldo Dias – Na esquina da igreja de São Pedro com a Av. Sete de Setembro, e logo ali a Secretatia de Seguranca, na Praça de Piedade: encontro com um grande mercador da alegria e com um sorrisão de fazer inveja a propaganda de pasta dental, Carlinhos Santos Pereira, Carlinhos Mocó, amigo, colega de trabalho e parceiro nas festas da Bahia, segurando uma grande faixa "Há Jacu no pau!" Grande amigo que, passados cinquenta anos, quando nos reecontramos é aquela mesma confraternização alegre daquele momento mágico! Cinco minutos depois éramos presos pela polícia! Mas não perdemos nossa fleugma de foliões! Bendita faixa da mocidade feliz democrática do nosso Antônio Conselheiro, Waltinho Queiroz!

Charles Pereira – Geraldo Dias, nosso Geo Beleza... Esse eu botei no crime!


Luiza Pinheiro – Os ensaios pré-carnaval na Barra, comandados pela incrivel Luz da Serra, que levava amigos, são inesquecíveis!

ANOS 70 BAHIA – Em nota na sua coluna do Caderno B do Jornal do Brasil, em 19 de fevereiro de 1973, Zózimo Barroso do Amaral informava aos cariocas: “O Bloco do Jacu, um dos mais tradicionais do Carnaval de Salvador, terá a participação de Vinicius de Moraes como mestre-sala e Gesse, sua mulher, como porta-bandeira. Engrossando o bloco, também, a figura do pintor Luís Jasmin”. Bastante improvável, entretanto, que o regente do “principado livre e autônomo de Itapuã” concretizasse a previsão plantada na coluna de Zózimo. Em seu livro "Minha vida com o poeta" (pg. 128), Gessy Gesse revela que “O poeta nunca participou do carnaval baiano, daquele frenesi com que os foliões se esbaldam durante os seis dias de festejos momescos em Salvador. Uma vez, em 1970, fomos ao Caju de Ouro, em Feira de Santana (...). A segunda participação se deu com o que ele fazia de melhor: compôs a música-tema do bloco Os Internacionais”. A foto em que Vinicius aparece com sua consorte baiana e amigos, em mesa carnavalesca no Hotel da Bahia, é uma das raras (se existirem outras) em que se vê Vinicius embrenhado na folia momesca.

Na festiva mesa no Hotel da Bahia, de onde o Jacu saía, Vinicius e Gesse compartilham a ferveção com Rubinho dos Carnavais (em pé), Sônia e Edinho Gantois e outros amigos. (Foto acervo pessoal de Gessy Gesse).

SUPERMAIS NOTÍCIAS – Quem acha que as cordas na folia de Salvador é coisa recente, está muito enganado. No slogan do extinto Bloco Jacu, criado pela moçada da classe média na década iniciada em 1960, estava expressa a existência da delimitação: “Não tem corda, porque tem coração”. (Domingo, 10 fev 2013) –http://supermaisnoticias.blogspot.com.br/…/carnaval-de-salv…

ANOS 70 BAHIA – Em meio à surpreendente dificuldade (no Google, inclusive) para garimpar imagens do Jacu nos anos áureos, encontramos no Youtube um vídeo bastante ralado e amador, mas com a pegada que notabilizou o bloco. Contamos com os parceiros de edição do livro Anos 70 Bahia para que postem imagens do bloco.https://www.youtube.com/watch?v=807AQqn2xOQ

Elsior Lapo Coutinho – Fantástico, muito bom... os ensaios às sexta feiras arrasavam também.

Mara Mar – A mesma época do “Ou dá ou desce”, que tinha como mascote um papagaio. Saudade.

Rafaela Princhak Magalhães – Tô de saco cheio da camarotização. Saudade de brincar na rua

Tacilla Siqueira – Detesto camarote!

Rafaela Princhak Magalhães – Também. Gente chata, produzida em série. Nada acontece. O povo só quer dar pinta. Affff!

Edmilson Araujo – Amigos, só quem viu o Jacu sabe da maravilha que era esse bloco. Era lindo ver o Jacu sair do Campo Grande, onde eu morava, pintar na Avenida 7 e todos gritarem: "Hajacu, Hajacu", era um delírio! Eu nunca vesti sua mortalha azul e branca, mas minha irmã saía nele e eu tinha de acompanhar! Bons carnavais!!!


5 comentários:

  1. quando acabava o desfile , eu ressuscitava .

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  2. o último carnaval que passei na minha terra foi em 76 no bloco do Jacu. em cima do caminhão ia a exuberante Marina Montini

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  3. O Jacú fez parte de minha juventude e é inesquecível pra mim.Jamais vou esquecer. Suetonio Pepe.

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  4. ... que o diga eu, um dos fundadores e Presidente. Já se passaram 57 anos desde
    a sua fundação. Parece que foi ontem. E como diria o Rei "foram tantas as emoções!".
    Mário Morgade Cortizo Varela

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