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Foto: acervo pessoal Fernando Noy |
Anos 70 Bahia – Episódio 9
Os mais alucinantes e festejados desfiles de fantasias do Carnaval dos
anos 70 aconteciam na celebrada “escadaria do pecado”, que dava acesso ao
prédio feioso do Palácio dos Esportes, no coração da praça Castro Alves. Sobram
recordações, faltam imagens. Nos baús de quem viveu e fotografou a contagiante
loucura de tais momentos, devem dormir tesouros ávidos por ser desenterrados e
postados nesta página...
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Foto Antonio Neto |
EDUARDO LOGULLO – Havia a ‘fechação’ das bichas. Exageradas, loucas,
abusadas, subiam nas escadarias para desfiles absurdos: Marcos Rebu, Domingos
Portella Lima, o argentino Fernando Noy (com a bunda inteira de fora, sua marca
registrada), Makumba, Pedra, Jaiminho Urubulina e a inenarrável Peteleka. Esta
última, mulher de verdade. Atores locais de teatro tornavam a mistura mais
eclética, agrupando Nilda Spencer, Jurema Penna, Álvaro Guimarães, Helena
Ignez, Sonia dos Humildes, Nonato Freire, Mario Gusmão, Sonia Dias, Gessy
Gesse, Bemvindo Siqueira, João Augusto, Márcio Meirelles, Eugênia Millet,
Jacques de Beauvoir, Teresa Sá, Eduardo Cabuz. Do povo de dança, Clyde Morgan,
Laís Salgado Góes, Lia Robatto. Os paulistas José Possi Netto e a ainda atriz
Zizi Possi faziam seu début no pedaço. Figuras de todos os naipes: Antônio
Risério, Paulo César de Souza, Dourado, Heitor Reis, Zezeca Joplin e sua irmã,
a fotógrafa Thereza Eugênia, Ieda Alves, Jorge Santori, Ney Galvão, Letícia
Muhana, Armindo Bião, Luciano Diniz, Dicinho, Nando, Aninha Franco, Carlos
Borges, Amilton Celestino, Luana de Noilles, Renatinho Gordo, Zulu. E até Cida
Moreyra. Festa de arromba”. (Chuva, suor e cerveja – (http://tropicalia.com.br/leituras-comp…/chuva-suor-e-cerveja).
FERNANDO NOY – Escadaria do pecado... lembro aquela primeira vez em que
saí somente com uma concha do mar atada com tranças tapando meu sexo, e o
bumbum com uma cortina de babados que, ao descer, caiu no embalo... houve um
grande silêncio... eu pouco entendia português e, de pronto, a multidão gritava
“barato, barato, barato!” Tratei de regressar, virando sem nem sequer saber que
estava de bunda fora, quando uma bicha divina que falava espanhol me esclareceu
que “barato”, em português, queria dizer o contrário do nosso idioma. Ali
recuperei o folego... e continuei descendo aquela a escada... ao final havia um
grupo de policiais me esperando para me levar até ali perto, na Barroquinha,
onde estava a delegacia... lembro que, antes de sair e para dar maior esplendor
a cena, simulei desmaiar-me e eles me portavam como uma alfombra humana, que
nem Cleópatra... fui detida e pensava: “Que horror, acabei de chegar ao Paraíso
e agora vou ser deportada! Mas nada disso... 15 eternos minutos depois,
chegaram para me buscar, já que o povo reclamava “a bicha argentina”. O
delegado resolveu que me deixaria sair se eu botasse uma saia que nem sei de
onde apareceu... ao regressar, compreendi que, desde esse momento, minha alma
seria para sempre baiana... saravá, Marquinhos Rebu – e com ele tod@s os
celebrantes daquele paraíso na Terra... axééééé!!!
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Foto Antonio Neto |
SÉRGIO SIQUEIRA – É vero! Fernando Noy foi carregado nu até a delegacia
da Barroquinha, acompanhado por uma imensa fauna carnavalesca, misturada aos
policiais e gritando “solta! Solta! Solta!” Na delegacia, negociação vai,
negociação vem e o delegado resolveu liberar o prisioneiro, desde que ele se
vestisse. Do nada pintou uma saia, que lhe coube com perfeição e todos voltaram
loucos para a Praça, começando tudo de novo.
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Foto Antonio Neto |
Mara Mar – E a praça era enfeitada de caretas, desfiles das bichas lindas e
muitos confetes e serpentinas; vivi, desci escadas, bebi nos bares da Ladeira
da Montanha (onde nem podemos mais passar!). Hoje, a praça não é mais nossa.
Regina
Soares – Por que parou? Parou por quê???
Eurico de Jesus – Ilustra muito bem como era a catarse coletiva que tive a felicidade
de conhecer/viver. A Praça Castro Alves era a capital mundial do hedonismo. Evoé,
Momo!
Dulce Maria Ferrero – Zulu Araújo, vc é citado!
Jose
Jesus Barreto – Alô jovens! Leiam, isso é
(foi) real. Em plena ditadura, anos de chumbo! Assim fazíamos cultura.
Criávamos. Construímos o carnaval baiano. Na Praça acontecia de tudo. Éramos
uns loucos libertários... em nome da beleza e do prazer da vida, tão somente.
Mario Peixoto – Nessa escadaria certa vez levei um primo em segundo grau com sua
filha adolescente. Ele chamava-se Nicolau Bina Machado e, quando o apresentei
ao grupo no qual se encontrava Sergio Siqueira, o fiz dizendo se tratar do
General Bina Machado. Ato contínuo, Sérgio prontamente anunciou aos demais, aos
berros: "Pessoal, limpeza total, estamos com o general!" Isso em
plena ditadura militar, causou grande repercussão e fez com que meu primo,
rapidamente, se evadisse da escada com a filha.
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Foto Antonio Neto |
Fernando Noy – Sueli Ribeiro Ribeiro me lembrou, outro dia, que a galera gritava "Soltem a loura!"
Em verdade, meus cavelos estavam destingidos pelo sol e eram longos. Lembro
também de Nilda Spencer com a piteira e suas amigas Regi Catarinho e Teresa Sá,
junto à itapariquenha Laodiceia de Albulquerque, Petúnia e Marquinhos Maciel,
Marilia Moraes e Dedé Gadelha entrando no embalo do trio elétrico, ante um
Cateano com Moreninho nos braços. Lembro do "yeiro da lolo", do
xarope Romilar, dos mis diferentes LSDs, da Sônia Braga, de William Summer,
Luciano Diniz, Yumara Rodrigues, Marquinhos Rebu, Diogenes Rebouças, Michel,
Marcos e Vera Queiroz, Gilberto Gil com Sandra Gadelha, muitos que eu ainda não
conhecia mas lotavam a escadaria. Turistas de todo o mundo e o escritor gaúcho
Fernando Caio Abreu, que me comentava rindo: "Você inventou o colaless".
Em outro carnaval, que Fernando Coelho e Tatti Moreno ganharam a decoração das
ruas, me construíram uma espécie de trono dentro da maquete que, depois, foi
real e eu utilizei dançando em cima e jogando quilos de purpurina que me haviam
deixado, como luminosos projéteis. Também armaram uma passarela de vinte metros
que, na primeria noite, caiu pelo embalo da alegria e o êxtase total... Nelson
Varon Cadena publicou uma foto dessa noite no livro que me enviou tão
gentilmente – podem consultar as imagens, já que Bahia Anos Setenta vai ser uma
antologia do desbunde, prazer, liberdade. O saxofonista argentino Leandro Gatto
Barbieri, que estava num deles, comparou a Bahia com Roma Negra. Foi e voltará
a ser nestas páginas um oásis inesquecível. "Eu sou a filha da Chiquita
bacana / não caio em cana...”. "Não se grile, a Rua Chile está botando pra
quebrar". "O carnaval é invençao do Diabo / que Deus abençoou."
Sigamos dançando simmmmmm!!!
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Foto: arquivo pessoal Fernando Noy |
Anos Setenta Bahia – Maravilhoso e purpuríneo depoimento, Fernando Noy! Dando brilho e ludicidade a Anos Setenta Bahia. Muchas gracias!!
Sueli Ribeiro Ribeiro – Vc é show.
Fernando Noy – todos nós...
temos que contar sobre a Praia dos Artistas, na saida de sua casa na Boca do Rio...
abrazos y mil besos, Sueli... te quiero!!!
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Na barraca do Aloísio Sky, Praia dos Artistas |
Eurico de Jesus – Sim, a praia da Boca do Rio, que um tempo depois passou a se
chamar Praia dos Artistas. Sue Ribeiro, João Del Águila, Zizi Possi, Possi
Neto, Jota Cunha, Babalu, Apolo, Moaba, Fafá Leonardo, Aloízio "Yellow
Sky", Antonio Risério, Sandra Gadelha, Gilberto Gil, a turma da banda
musical Sexteto do Beco, Capenga do Grupo Bendegó, Ticão da Escola de Teatro,
os bailarinos dos Frutos Tropicais, o professor de balé e coreógrafo Carlos
Moraes, Tereza Oliveira, Diógenes Moura, a barraca de Carlos, os músicos da banda
Reflexus, Gilson Rodrigues, Vanya King, Marcos King, Lina King, Beg Figueiredo,
Keka Almeida, Giovanni Luquini, Ary da Mata, Helder Barbosa, Era Encarnação,
César Romero, Arthur Carmel, Jorge Alfredo, Jorge Papapá, Leguelé, Theodomiro
Queiroz...a lista é muito grande e chega até aonde minha memória alcança!
Fernando Noy – Que
fantástico... Obrigado, Eurico... Também Carlos Bastos, Luís Melodia, Guido
Lima, Mario Cravo Neto, Ângela Cunha, Paulo Barata, Edgard Navarro... que além
disso eram vizinhos da Boca de Rio... ainda temos mais... seguro... Beijos mil!
Eurico de Jesus – Beth Muhana, Guilherme Maia, eu, Pedro Gil (jogava voleibol com
a gente), Carlinhos Cor das Águas, Marron (repórter), Zulu Araújo, Pola
Ribeiro, Rogério Menezes (repórter) e Galvão, dos Novos Baianos, fazendo
campanha para vereador cujo lema era: "Vote em Galvão e libere o
morrão"...
Beleza pura...
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